Avanços legislativos no tratamento dos animais
07FebEm dezembro de 2021, foi aprovada a Lei n° 3.917, do município de São José dos Pinhais (PR), que “institui a Política Municipal de Proteção e Atendimento aos Direitos Animais”, aprovada de forma unânime pela Câmara Municipal e sancionada sem vetos pela prefeita do município.
A lei é oriunda do Projeto de Lei nº 299, de 16 de novembro de 2021, apresentado pelo vereador Michel Teixeira de Carvalho (PSD), a partir de um anteprojeto elaborado no âmbito do Núcleo de Pesquisas em Direito Animal do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e do Núcleo de Justiça Animal da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
A referida lei representa um grande avanço no tratamento dos não humanos, em que pese a sua abrangência seja em nível municipal.
A Lei nº 3.917 define aspectos que vão desde aos princípios de sua base até os direitos fundamentais dos não humanos, sendo que os animais abrangidos pela lei “são os de estimação ou companhia, bem como os utilizados para realização de trabalhos ou de tração veicular”.
Ao definir tais normas, o legislador apontou para alguns princípios que regem o tratamento para com os animais, nos seguintes termos:
“Artigo 2º — São princípios da Política Municipal de Proteção e Atendimento aos Direitos Animais:
I — Dignidade Animal: os animais devem ser tratados como sujeitos de direitos, dotados de valor intrínseco e de dignidade própria, vedado o seu tratamento como coisa;
II — Participação Comunitária: é garantida a participação da comunidade, diretamente ou por meio de suas organizações comunitárias, na formulação da política municipal de atendimento aos direitos animais, bem como no estabelecimento e implementação dos respectivos programas;
III — Educação Animalista: o atendimento e o respeito aos direitos animais devem ser implementados por meio da inclusão do tema nos currículos escolares e por campanhas educativas, utilizando-se os meios de comunicação adequados, nas escolas, associações de bairro, canais oficiais de comunicação do Governo Municipal e em outros espaços comunitários, que propiciem a assimilação pelo público em geral acerca de:
- a) adoção ética e responsável de animais de estimação;
- b) existência da consciência e da senciência animal;
- c) sofrimento animal; e
- d) enaltecimento das práticas de vivência e convivência mais éticas, pacíficas e solidárias, dentro de uma perspectiva multiespecífica, zoopolítica e não-especista;
IV — Cidadania Animal: os interesses dos animais, especialmente aqueles que habitam as cidades, devem sempre ser levados em consideração nas leis municipais que possam impactá-los;
V — Substituição: sempre devem prevalecer os métodos alternativos disponíveis que substituam a utilização de animais para fins humanos”.
Também denota um avanço na medida em que reconhece os animais enquanto sujeitos de direito, eis que, para a norma, “os animais são reconhecidos como seres conscientes e sencientes e dotados de dignidade própria, sujeitos despersonificados de direito, fazendo jus à tutela jurisdicional, individual ou coletiva, em caso de violação de seus direitos”.
Para Vicente de Paula Ataíde Júnior, o dispositivo serve “para reafirmar as bases estruturantes do Direito Animal municipal: reafirma-se a interdição constitucional às práticas cruéis contra animais e o reconhecimento da dignidade animal, como decorrência da sua consciência (da qual decorre a senciência, enquanto capacidade de sentir e de sofrer), conduzindo-os à sua inclusão em nossa comunidade moral e jurídica como sujeitos de direitos”.
Além disso, também aponta para os direitos fundamentais que são inerentes aos animais não humanos, tais como respeito à vida, à dignidade individual e à integridade de suas existências, física, moral, emocional e psíquica; alimentação e dessedentação adequadas; abrigo adequado, salubre e higiênico, capaz de protegê-los de chuva, vento, frio, sol e calor, com acesso a espaço suficiente para que possa exercer seu comportamento natural; destinação digna, respeitosa e adequada de seus restos mortais, vedado serem dispensados no lixo; acesso à justiça, para prevenção e/ou reparação de danos materiais, existenciais e morais e aos seus direitos individuais e coletivos; dentre outros.
Todos esses pontos demonstram ser inequívoco o processo de avanço no tratamento jurídico dado aos animais, sobretudo quando se está diante do reconhecimento deste enquanto sujeitos de direito e tendo em mente os direitos fundamentais previstos.
Por muitos anos, em um cenário antropocêntrico e especista, animais foram tratados enquanto “coisas” e destinados à satisfação dos interesses dos humanos. A lei são-joseense servirá enquanto modelo para que outros municípios (estados, inclusive) avancem nesse mesmo sentido, conferindo aos animais um tratamento digno e que não esteja adstrito aos interesses dos humanos.
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